Ícone do site Sondery – Acessibilidade Criativa

Sonderycast #01: Acessibilidade em lojas online durante a Black Friday

Imagem na horizontal dividida ao meio, o lado esquerdo tem fundo azul escuro e o direito rosa. Há o texto em letras grandes em branco com contorno rosa: "01 acessibilidade em lojas online durante a Black Friday". No canto inferior direito há o logo do Sonderycast.


Neste primeiro episódio do Sonderycast, a equipe da Sondery fala sobre a importância da acessibilidade para o sucesso das lojas online, mostrando a parte conceitual, legal e prática da acessibilidade quando o assunto é compras online. E convidamos pessoas com deficiência para dar depoimentos sobre experiências de compra positivas e negativas, ilustrando assim o assunto com casos reais que nós analisamos para dar uma luz sobre a questão.

[Rafael Duarte]

Acessibilidade em lojas online durante a Black Friday, esse é o tema do primeiro Sonderycast, o Podcast da Sondery. Eu sou Rafael Duarte, diretor de conteúdo da Sondery, e logo de cara vou passar a bola para a Ana, pra ela contar um pouco melhor pra gente o que é acessibilidade.

[Ana Clara Schneider]

Acessibilidade significa proporcionar o acesso ao maior número de pessoas possível e para garantir isso , às vezes é necessário remover as barreiras que possam estar impedindo esse acesso.

Por isso é tão importante a gente entender a definição correta do termo “pessoa com deficiência” porque está lá na convenção da ONU e na LBI, pessoa com deficiência é aquela que tem um impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual em interação com com uma ou mais barreiras pode impedir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Ou seja, quem tem que mudar e se adaptar é o ambiente e a sociedade, e não o indivíduo com deficiência. Até porque são 15% da população mundial e quase 25% da população brasileira. São milhões e milhões de pessoas que já são ou poderiam ser consumidores de muitas marcas se tivessem o mesmo acesso a elas. A Sondery existe para isso, fazer com que as pessoas com deficiência sejam reconhecidas como consumidoras e acompanhar as marcas nessa jornada de reconhecimento.

[Rafael Duarte]

Será que as lojas online estão considerando as pessoas com deficiência como consumidoras, como clientes? Bom, a gente conversou com algumas pessoas com deficiência e pediu para que elas nos contassem algumas experiências positivas e negativas de compras feitas em lojas online e vai ser bem legal pra gente ilustrar aqui esse podcast. A gente começa com o depoimento da Ana Gouveia.

[Ana Gouveia]

Pensa numa pessoa que comprou nessa Black Friday… geeeente. Haja cartão.

Uma experiência que foi bem, bem, bem legal foi de comprar no site da Chico Rei; camisetas, enfim, várias outras coisas. Estava com uma promoção maravilhosa e assim, a navegação muito flúida. Eu comprei pelo site mobile, tem uns descritivos muito bacanas das imagens em si, não necessariamente descrever o que tem na imagem, mas a vibe da imagem, sabe? Eu achei muito bacana, além do produto ser maravilhoso. A navegação foi super flúida, eu não tive problema nenhum na compra, foi bem de boas, chegou rápido, tá tudo certo. 

Em geral eu tenho experiências minimamente acessíveis assim, não tenho muito o que reclamar de Amazon, Submarino, Magalu… seja aplicativo ou seja site, mas eu tive uma experiência horrível, horrorosa, a nível não conseguir comprar, na Hering. Tinha muitas promoções pelo aplicativo, algumas no site bem bacanas, mas pelo aplicativo tinha muitas. Não deu. Eu só conseguia fazer busca, mas não conseguia navegar nos produtos. Eu tenho baixa visão, então algumas coisas eu conseguia fazer com o leitor de telas desligado, mas eu não consegui finalizar a compra, não tinha como, não ia. Simplesmente não ia. Ficava o background invertendo com o… nossa gente, vocês não estão entendendo, só testando pra entender!

[Rafael Duarte]

Bom, esse depoimento da Ana Gouveia é muito interessante. Porque por um lado é claro, né, ela traz essa questão das barreiras ou ela traz essa questão da experiência bacana de compra, que ela teve no Chico Rei. Mas por outro lado ela traz uma outra questão, que não sei se vocês perceberam, mas é a questão de que ela estava ali comprando camisetas, né? Então quem é o consumidor com deficiência. Quem é essa pessoa com deficiência que está buscando nas lojas online promoções, produtos… então, novamente, Ana Clara, explica pra gente sobre isso.

[Ana Clara Schneider]

Uma vez a gente aqui na Sondery fez um paralelo com o termo PCD, que além de se referir a pessoa com deficiência, também deveria ser lido como pessoa com direitos, com dinheiro e com desejos. É preciso que as marcas desconstruam uma imagem estereotipada e uma percepção totalmente passiva da pessoa com deficiência, como se ela só tivesse interesse em produtos de saúde ou reabilitação. Assim como a deficiência é só uma das características que define um sujeito, podem ter muitas outras características e pontos de interesse: cultura, lazer, gastronomia, moda, e por aí vai.. 

De acordo com a consultoria Accenture, a comunidade com deficiência pode ser considerada a terceira potência econômica do planeta, com potencial para movimentar 8 trilhões de dólares por ano.

E vale lembrar que quando a gente pensa em uma situação de compra, não estamos falando só dos consumidores diretos, mas dos indiretos também, e a pessoa com deficiência também pode ter amigos, familiares, colegas de trabalho, contatinhos, enfim, toda uma galera que pode aceitar ou declinar uma decisão na hora da compra. 

[Rafael Duarte]

A gente fez uma pesquisa aqui na Sondery que inclusive está disponível para download, ela chama “Por que as pessoas cegas não compram no seu e-commerce”, e a gente descobriu que 71% dos entrevistados, pessoas com deficiência, nunca fizeram compras online. E entre os principais motivos que eles apontaram, 98% disseram que tinham ouvido relatos ruins de outras pessoas sobre as lojas e por isso nunca fizeram compras, 95% falaram sobre a exposição de dados financeiros e pessoais durante a compra e 88% falaram da falta de acessibilidade. E agora a gente vai ouvir o relato da Karyn, que ilustra bem esse cenário. 

[Karyn Krauthein]

Olá, meu nome é Karyn Krauthein e eu tenho baixa visão em ambas as vistas. 

Todas as vezes que eu precisei fazer algum tipo de compra online eu sempre fiquei muito receosa, porque além de você ter que consultar alguns dados que às vezes mesmo ampliando a tela há a necessidade de ficar consultando os tamanhos, se for uma roupa ou um sapato, tem que fazer medições e tudo mais, tem a questão de preencher campos e eu sempre fiquei com muito medo de fazer isso de maneira errado e ou mandar para um lugar que não seja minha casa, um endereço errado, ou não pagar de forma correta se for alguma coisa em relação a parcelas e tudo mais. Então eu sempre evito fazer compras online o máximo que eu posso por causa disso, porque eu sempre tenho medo que eu acabe preenchendo alguma coisa de maneira que dê algum problema e isso acabe prejudicando a compra e eu tenha que trocar. E enfim, acaba dando alguma dor de cabeça no fim das contas.

[Rafael Duarte]

A Karyn coloca algumas das preocupações dela sobre “e se der errado a compra”, “e se eu mandar pro lugar errado”… então são questões bastante importantes e bastante preocupantes de fato. E pra comentar sobre esse assunto dos direitos legais das pessoas com deficiência relacionados à loja online ou promoções como a Black Friday, a gente chamou o Leonardo Spinola, que é consultor de acessibilidade na Sondery.

[Leonardo Spinola]

Quando o assunto é acessibilidade e Black Friday, o direito dá dois pontos muito importante a se entender. O primeiro e o mais específico deles é a Lei Brasileira de Inclusão, que em seu artigo 63 diz que todo site no Brasil precisa respeitar as disposições internacionais de acessibilidade.

O segundo, que pode parecer que não tem muito a ver com acessibilidade, é a Lei Geral de Proteção de Dados. O que isso tem a ver com acessibilidade? A LGPD trata de dados pessoais, sensíveis… no caso de uma Black Friday da vida, cadastro de clientes, cadastro de cartões de crédito, meios de pagamento, endereços e etc. Como isso tem a ver com acessibilidade? Devolvendo a pergunta: como uma pessoa com deficiência enfrentando as barreiras de um site não-acessível vai ter certeza que os seus dados e o seu endereço, o seu cartão de crédito e coisas do tipo estão sendo tratadas de forma segura? Se já é difícil para usuários sem deficiência.

Estes são os principais dispositivos que tratam sobre acessibilidade quando o assunto é Black Friday.

[Rafael Duarte]

E saindo um pouco dessa questão conceitual do que é acessibilidade, quem é o consumidor com deficiência, os seus direitos, né? Vamos falar um pouco sobre a parte técnica dos sites. É possível fazer uma loja online acessível para o máximo de pessoas possíveis, com ou sem deficiência? Bom, a primeira questão é: existem diretrizes, existem normas, técnicas a serem seguidas? E para comentar sobre isso a gente chamou a Sandyara Peres, consultora de acessibilidade aqui na Sondery. 

[Sandyara Perez]

Temos sim! Temos as diretrizes de acessibilidade para o conteúdo na web, que é a WCAG, são diretrizes internacionais sobre acessibilidade em meios digitais, em meios online e meios da internet. Temos também o eMAG, Modelo de Acessibilidade em Governo Eletrônico, que ele é feito em cima, uma versão especializada da WCAG, com foco em portais do Governo Brasileiro; contudo ele é feito em cima da WCAG 2.0 sendo que a mesma já se encontra em sua versão 2.1. E também temos o selo de acessibilidade digital da Prefeitura de São Paulo, que posssui aí etapas para serem avaliadas em um site a fim de garantir esse selo. Então temos bastante material aí, inclusive em Português, que você pode consultar a fim de saber, ok, como criar um site, uma loja online e ela em si já nascer acessível. Então temos sim boas práticas e regras pra isso.  

[Rafael Duarte]

E a Luciana Oliveira, outra consultora de acessibilidade também da Sondery, preparou algumas dicas para falar sobre acessibilidade online, principalmente em lojas online. Qual os primeiros passos para tornar uma loja online acessível?

[Luciana Oliveira]

No caso, a melhor recomendação que eu daria, é atenção com a parte de Font End do seu site. Então verificar se a hierarquia de cabeçalhos está fluida, se está estruturada corretamente essa arquitetura, está feita de uma forma correta, com título, subtítulo, subtítulos terciários, se os botões estão rotulados corretamente com a ação que se pede para que ele processe aquele botão. E se pensar numa experiência mobile, se aquele aplicativo é nativo, então buscar todas as questões de recomendação de acessibilidade pra Apple, por exemplo, que ela oferece para developers, pra Android também é a mesma coisa, se no caso o aplicativo é híbrido, então tentar ver dentro daquela plataformar, daquele framework em que está sendo desenvolvido, o que que ele oferece em questões de acessibilidade.

Mas também tentar as primeiras questões que eu relatei há pouco para tentar oferecer essa experiência, porque basicamente os leitores de tela eles se norteiam principalmente pela semântica de HTML. Então se você tem uma semântica bem estruturada, bem feita, você vai oferecer de 30% a 35% de uma boa experiência pra um usuário que tenha deficiência visual. Pra quem tem baixa visão você teria que entrar também numa boa semântica de CSS, no caso fontes com tamanho legível, área de toque pra quem usa aplicativos no celular e o restante seria mais com o pessoal de UX pra montar esse fluxo e manter uma boa experiência também.   

[Rafael Duarte]

Bom, agora que a gente já sabe sobre essas diretrizes de acessibilidade do WCAG e a gente já ouviu também um papo mais técnico da Lu, vamos ouvir também o depoimento do Felipe Zaniboni. 

[Felipe Zaniboni]

Essa experiência de compra de Black Friday que foi negativa foi nas Lojas Americanas. Onde eu consigo iniciar o fluxo, fazendo a pesquisa do produto, ler a descrição, mas na hora de concluir o pagamento, onde eu vou colocar o número de parcelas, o elemento no código que eles usam não é semântico para o leitor de telas, é um botão que quando você aciona ele não dá as opções de parcelas. E fuçando nessa página, depois que você aciona o botão, o leitor de telas acaba encontrando esse modal que abriu depois do rodapé, porque ele deve estar no código nossa ordem, mas no CSS no centro da tela. Então quando você acha ele ainda, é só a janela de diálogo. Então tem que usar um OCR pra ler essa janela, achar a opção que você quer, copiar ela como texto, sair do OCR, dar um buscar, colar a opção que você quer e apertar Enter duas vezes. Só pra escolher o número de parcelas e concluir a compra. Então poucos usuários com deficiência conseguiriam chegar nesse nível e fuçar e concluir a compra. 

[Rafael Duarte]

Pois é, né gente… vocês acham que qualquer pessoa, com ou sem deficiência, deveria passar por essa experiência de praticamente “hackear” um site só para conseguir finalizar uma compra numa loja online? Acho que não, né? Bom, mas quem tem loja online hoje e ainda não é acessível, a gente passa mais uma pergunta pra Sandy, que é: dá pra transformar uma loja que não é acessível em acessível, ou é preciso refazer tudo do zero?

[Sandyara Perez]

Não vou dizer que é impossível consertar, mas que é mais trabalhoso do que se eu tivesse pensando em acessibilidade desde o início, é. Vamos supor que eu acabei de lançar um site da minha loja online de eletrônicos e ele está completamente inacessível. Isto é, vamos supor que ele não responde bem com leitor de tela, as imagens não estão bem descritas, as páginas não possuem um bom contraste e essas cores são a partir da minha identidade visual… então eu vou ter que ter o trabalho de refazer o design, testar com o leitor de tela, talves mudar o conteúdo, as palavras que eu estou utilizando em minha comunicação. Pode ser que aconteça que, dependendo do ramo que eu estou atuando, eu passe por alguma auditoria e isso gere alguma penalidade, alguma multa, e eu já vou ter tido esse prejuízo.

Isso tudo seria sanado se eu tivesse pensado em acessibilidade desde o início. Impossível não é. Mas que é muito mais trabalhoso e eu terei mais prejuízos, com certeza.

[Rafael Duarte]

A gente acredita, aqui na Sondery, que todos os sites, incluindo as lojas online, claro, precisam ser acessíveis. A gente está falando da internet, né, que é esse grande mundo virtual sem barreiras onde todas as pessoas deveriam conseguir acessar todos os conhecimentos do mundo, né? Então é muito contraditório que na hora de construir os sites e as lojas online as pessoas criem essas barreiras, que acabam excluindo parte da população, que acabam impossibilitando que as pessoas com deficiência consigam acessar esses sites, consigam finalizar as compras nas lojas online. E tudo isso porque essas pessoas com deficiência não foram consideradas consumidoras, né? Lá atrás não foram consideradas clientes, foram ignoradas como clientes, como pessoas com poder de compra, com poder de decisão, com vontades, como a Ana disse. 

E a gente espera que esse primeiro Sonderycast tenha trazido uma luz sobre esse assunto, sobre a importância de investir em acessibilidade em sites e lojas online. E que apesar da gente ter usado a Black Friday como contexto para falar desse assunto, a gente sabe que compras online são feitas todos os dias, né? E que também não vão faltar datas comemorativas de compras, como a Black Friday agora, Cyber Monday, Natal… o importante é que esse investimento em acessibilidade seja feito, que comece a ser feito, para que o quanto antes as pessoas com deficiência tenham acesso ao seu site, que consigam fazer as compras de forma autonoma e independente.

E chegamos ao final deste primeiro Sonderycast, esperamos que vocês tenham gostado. A gente está preparando novos episódios sobre acessibilidade, acessibilidade digital, inclusão, diversidade… espero que vocês acompanhem a gente e até a próxima.

Sair da versão mobile