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Signmark: o rapper surdo e um baita show

Fotografia do Signmark, um homem branco usa boné preto virado para trás e uma camiseta cinza. Ele está com os braços a frente do corpo e a mão direita com o dedão, indicador e dedo do meio abertos, direcionados para a frente como uma arma.

Ao contrário do que muitos pensam, uma pessoa surda pode curtir – e muito! – um show de música. Isso fica bem claro quando um vídeo de uma banda famosa junto com um intérprete viraliza na internet (como foi o caso da Amber Galloway com Red Hot Chilli Peppers). Mas é claro que aqui no Brasil também temos exemplos tão legais quanto esses.

Mas o que menos pessoas param pra pensar é que um surdo pode não só curtir, como PRODUZIR música. Duvida? Dá o play nesse clipe do Signmark:

A primeira vez que eu vi esse clipe, vi umas 10 vezes seguidas. Na semana seguinte eu vi mais 15. E até hoje em toda oportunidade que eu tive e tenho, eu mostro em aula, palestra, envio pras pessoas, mostro na mesa do bar, no restaurante, no whatsapp… e eis que surgiu no sábado passado (14) a segunda oportunidade de ver esse cara AO VIVO.

SEGUNDO SHOW AO VIVO? COMO ASSIM?

O Signmark já veio ao Brasil outras vezes, principalmente para os eventos da Sencity – uma festa multissensorial criada na Holanda pela Skyway Foundantion que também acontece no Brasil desde 2011 – e foi em uma dessas edições que eu tive a primeira experiência de “trocar de lado” com a comunidade surda e ser a ouvinte em minoria.

Nesse documentário você pode ver como foi a edição de 2013, entender a vibe do evento (e de quebra conhecer a Ana Clara com 23 anos!). A festa é pensada para explorar todos os sentidos além da visão e audição: comidas e bebidas moleculares, texturas pelos ambientes, DJ de aromas que mixam essências junto com as músicas, uma plataforma na pista que intensifica as vibrações para danças e o grande astro da noite era ele, Signmark.

Naquela época meu contato com a comunidade surda e a língua de sinais estava começando e certamente esse show ajudou a catapultar meu amor e encantamento pela Cultura Surda. Sempre falei desse show como um divisor de águas e era muito difícil explicar pra ouvintes sem contato com surdos como isso era possível.

Então eu fiquei BEM FELIZ de poder assistir e registrar esse show de novo, agora com outro peso.

Mas afinal de contas, como é o show?

Como qualquer outro, oras:

Descrição resumida do vídeo: no palco dois homens cantam – um faz a voz, é negro e está a esquerda do palco, um é branco, faz em sinais e está no centro do palco. 

Resumindo ficaria assim: o Signmark canta em sinais, outro cantor faz a voz e um DJ vai controlando a melodia, no caso não tem instrumentos ao vivo.  Mas não dá pra resumir! O que eu acho mais legal é o protagonismo da língua de sinais – que no caso é americana (American Sign Language – ASL) – no palco e o contraste com o que é “mais comum” quando vemos acessibilidade em shows de ouvintes: o intérprete fica num cantinho enquanto o cantor tem o palco todo. Nesse caso o surdo é o foco, ele é quem comanda o show, ele é o protagonista, ele é o líder. A voz acompanha, mas de lado.

Logo no começo do show eu já tava emocionada e aí me perguntei “como será que seria se todos soubessem a letra?“, porque eu mesma não sou fluente nem em Libras, que dirá ASL. Mas minha resposta chegou quando o Signmark ensinou o refrão de Talk the Talk pra galera e foi assim:

Descrição resumida do vídeo: todos da platéia estão fazendo os mesmo sinais dos cantores do palco. Na frase “talk the talk” as mãos ficam para frente e os dedos retos se tocam, abrindo e fechando, como uma boca. Na frase “walk the walk” as mãos fazem o movimento de pés andando. 

Difícil foi gravar sem pular! Vejam outros trechos:

Descrição resumida do vídeo: no palco, Signmark  está com a mão direita apoiada na mão esquerda a frente de seu corpo. Quando ele levanta o braço direito, toda a platéia levanta os braços também, provocando uma “onda”. Depois todos ficando agitando os braços no ritmo da música. 

E agora a mesma música do clipe do começo do post, ao vivo (sorry, essa não deu pra ficar muito parada, é minha preferida!)

Descrição resumida do vídeo: em cima do palco há 3 homens, Signmark está no centro sinalizando a música. A platéia balança ao som da música. 

Quem me conhece sabe que eu amo show. Troco qualquer tipo de atividade de lazer por show. Balada ou show? Show. Barzinho ou show? Show. E o show do Signmark, como experiência em si, é tão completo quanto qualquer outro. Tem interação dele com o público, tem os percalços de algo ao vivo, tem selfie com a plateia, tem tudo e é uma experiência divertida para todos. Surdos, ouvintes, quem sabe Libras, quem sabe ASL, quem não sabe nenhum dos dois, adultos, crianças, homens, mulheres. E eu to falando todos TODOS mesmo. 

Acessibilidade Ultimate Level: um surdocego no show

Se você não estava vivendo numa caverna durante a Copa do Mundo, muito provavelmente chegou até você um vídeo de um torcedor surdocego com dois guias-intérpretes narrando o jogo do Brasil. Pois o Carlinhos não gosta só de futebol e também marcou presença no show. Aí a libras tátil ficou ainda mais legal!

Descrição resumida do vídeo: em frente a um palco iluminado de vermelho, no meio da platéia um homem surdocego está curtindo o show, a sua frente uma mulher faz libras tátil e um homem está tocando suas costas com os indicadores. 

A guia-intérprete a sua frente está fazendo a letra em ASL, e nas suas costas o guia-intérprete vai mostrando a localização dos músicos no palco. É incrível ou não é?

Quando o show terminou eu estava feliz e cansada, sobrou tempo só para dar aquela tietada e perceber como eles são altos.

 

Tenho certeza que um dia ele estará no Lollapalooza. No que depender de mim, no próximo. Pode printar e me cobrar depois.

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