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Fazer coisas estúpidas pode ser uma forma de mudar o mundo

Em frente a um fundo verde claro há dois pedaços triangulares de melancia.

“Quer aparecer? Então coloque uma melancia no pescoço!”

Vai dizer que nunca ouviu isso? Ah, eu já. É figurinha carimbada, jargão de gente impaciente e chata. Ouvi mais de uma vez; várias vezes, por sinal, não sei com exatidão quantas. Mas pra ser sincero, nunca dei valor. Sempre me soou como uma tremenda patifaria. E era mesmo, claro, pois quem me falava estava de fato tirando uma com a minha cara. Entretanto, se tirarmos o tom de chacota, o que sobra é um conselho valioso.

Não me entenda mal, luta e militância são coisas sérias. Nós da Sondery bem sabemos disso. Aqui somos bastante engajados com as causas das pessoas com deficiência e não à toa o nosso maior propósito é fomentar a cultura da acessibilidade. Isso significa que a gente, além de fazer um excelente trabalho de consultoria de acessibilidade (modéstia à parte você já assistiu ao primeiro comercial da televisão brasileira aberta a ter audiodescrição no canal principal? Pois é, ficou demais e fomos nós que fizemos), nós também criamos conteúdos para enfiar gentilmente na cabeça das pessoas a importância da inclusão, da acessibilidade e da representatividade.

Quando digo importância, claro que eu estou considerando que pessoas diferentes consideram coisas diferentes como “importantes”. Nós sabemos disso e te garanto que estamos bem com isso. O empresário quer retorno financeiro e é isso que vamos oferecer para ele com a acessibilidade: o aumento potencial de público, melhoria dos seus produtos e serviços. As pessoas com deficiência, que querem exercer o seu poder de escolha e compra que lhes é de direito, só ganham com isso.

Mas e a melancia?

Às vezes a seriedade pode ser enfadonha, pode causar um certo cansaço e afastar a atenção de quem queremos conscientizar. Veja você, foi preciso que milhares de pessoas entornassem baldes de gelo sobre suas próprias cabeças para trazer novo fôlego, descobertas e tratamentos para uma doença até então considerada incurável. Você se lembra do Ice Bucket Challenge, o famoso “desafio do balde de gelo”? Ele começou em 2015 e bombou nas redes sociais em 2018 quando viralizou entre artistas e famosos depois que o Mark Zuckerberg participou. Já soube os resultados dessa “estupidez” toda?

Um ano após o início do desafio e 115 milhões de dólares arrecadados, foi encontrado o gene associado à esclerose lateral amiotrófica. Uma baita conquista. O dinheiro foi distribuído igualmente entre seis grupos de pesquisadores que seguiram com seus estudos.

Há algumas semanas, 220 milhões de dólares já arrecadados, a Dr. Sabrina Paganoni, do Massachusetts General Hospital, nos Estados Unidos, divulgou dados animadores dos testes que ela está realizando com seus pacientes. Os resultados, mais conclusivos e definitivos, ainda estão para sair, mas apesar de ainda não existir uma esperança próxima de cura, as perspectivas são de que em breve poderemos ter tratamentos para retardar o avanço da doença e garantir que as pessoas mantenham suas funções motoras por mais tempo.

Sensacional, não é mesmo?

Sejamos realistas, criar uma campanha viral desta forma é extremamente complicado. Eu bem sei, pois trabalhei anos em agências de publicidades cujos clientes viviam querendo “viralizar” seus produtos nas redes sociais. Não é simples assim, não é algo que dá para fabricar, não é de uma hora pra outra. O próprio desafio do balde de gelo demorou três anos para emplacar.

E o que tudo isso tem a ver com a Sondery?

Uma das nossas maiores frentes de trabalho são as nossas iniciativas. Desde o começo nós entendemos a importância de criar e apoiar iniciativas que ajudassem a difundir e fomentar a cultura da acessibilidade no Brasil. Fizemos o programa Mudando de Assunto, para entrevistar pessoas com deficiência sobre qualquer outro assunto que não fosse a deficiência, quebrando os paradigmas da mídia tradicional e capacitista. Nós organizamos o primeiro bloco de carnaval inclusivo e acessível do carnaval de rua oficial de São Paulo, que tirou muita gente de casa que não ia pra rua no carnaval há anos (e algumas que nunca tinham ido). Fizemos oficinas de fantasia acessíveis. Criamos o ParaOuvir, um álbum de fotografias sonoras. Organizamos o Acessorama. E… bem, a lista não para por aí e tem coisa que nem foi lançada ainda.

Com todo esse portfólio de projetos, você deve estar pensando que já fizemos de tudo. Mas tem uma coisa em toda a nossa história de luta e militância pelas causas das pessoas com deficiência e pela acessibilidade, que nós ainda não fizemos. O que? Nós nunca penduramos uma melancia no pescoço. E fico pensando, será que a quarentena está me deixando louco ou esta é realmente uma boa ideia que daria certo? O que você acha?

Esse texto não nasceu com a ideia de apresentar uma conclusão fundamentada sobre nada. Muito pelo contrário; ele serve para aumentar as incertezas. Vamos continuar com nossos projetos, refletindo sobre seus resultados e tudo o que podemos fazer diferente e melhor no futuro. E nada nos impede de colocar uma melancia no pescoço uma hora dessas, pois se ela não funcionar, não tem problema; nós podemos parti-la ao meio e  comer de sobremesa, adoramos melancia.

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